Retenção Dolosa de Salário: Aspectos Contábeis, Jurídicos e Implicações Para Empresas
Entendendo a Retenção Dolosa de Salário
A retenção dolosa de salário corresponde à conduta intencional do empregador de não repassar integral ou pontualmente o pagamento devido ao trabalhador. Trata-se, portanto, de um ato com dolo, ou seja, com a intenção de causar prejuízo à parte empregada.
Diferente de casos fortuitos ou de simples inadimplemento contratual por dificuldades financeiras, a retenção dolosa caracteriza-se por uma postura ativa do empregador, que mesmo possuindo condições de efetuar o pagamento, opta por não fazê-lo.
Esse comportamento pode ser enquadrado como ilícito civil, com consequências trabalhistas, tributárias e até criminais, conforme a evolução do ordenamento jurídico brasileiro.
O Fundamento Jurídico da Obrigação de Pagar Salário
A obrigação do empregador de pagar o salário no prazo estipulado está prevista no artigo 459 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Esse dispositivo determina que:
“O pagamento do salário, qualquer que seja a forma de sua estipulação, não deve ser estipulado por período superior a um mês, salvo no que concerne a comissões, percentagens e gratificações.”
Além disso, o parágrafo primeiro do mesmo artigo afirma que:
“O pagamento do salário deverá ser efetuado até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido.”
Portanto, o descumprimento dessas regras, especialmente quando repetido ou intencional, pode configurar ilícito e ensejar medidas legais de proteção ao trabalhador.
Repercussão Contábil da Retenção Intencional de Salários
Responsabilidade Fiscal e Obrigações Contábeis
Sob a óptica contábil, a folha de pagamento representa uma das principais obrigações mensais de qualquer empresa. Estas obrigações impactam diretamente:
– O resultado do exercício (quando registradas como despesa de pessoal);
– O cumprimento de obrigações acessórias (eSocial, DCTFWeb, GFIP antes do eSocial);
– A regularidade fiscal e tributária (INSS, FGTS e IRRF sobre a folha).
A empresa que decide, dolosamente, reter salário incorre em possível fraude contábil, uma vez que poderá registrar a despesa sem o efetivo desembolso, ou manipular seu passivo de forma indevida. Tal prática pode representar distorções no balanço patrimonial e na demonstração do resultado, comprometendo auditorias, avaliações de crédito e due diligences em operações societárias.
Riscos Tributários Envolvidos
Além dos aspectos trabalhistas e contábeis, há sérias implicações tributárias. A retenção dolosa pode configurar:
– Sonegação fiscal, se houver retenção de encargos (INSS, IRRF, FGTS) sem o respectivo recolhimento;
– Apuração incorreta do lucro presumido ou real, se a empresa manipular a base de cálculo ao não considerar despesas efetivamente devidas;
– Atos lesivos à ordem tributária, nos termos da Lei nº 8.137/1990, em especial o artigo 1º.
Tais práticas podem gerar multas pesadas, autuações da Receita Federal, problemas com a inspeção do trabalho e até responsabilização criminal dos sócios-administradores da empresa, a depender da caracterização do dolo.
Fundamentos Jurídicos Para Advogados Trabalhistas e Empresariais
Implicações Contratuais e Patrimoniais
Juristas atentos à boa governança e ao compliance devem considerar que a retenção dolosa compromete a estabilidade jurídica da empresa. Do ponto de vista contratual, o não pagamento de salários não apenas quebra o contrato de trabalho, como pode fundamentar:
– Ações de rescisão indireta propostas por empregados (art. 483, CLT);
– Ações trabalhistas com inclusão de indenização por danos morais e materiais;
– Ações de responsabilização dos sócios (inclusive com desconsideração da personalidade jurídica, conforme artigo 50 do Código Civil);
– Responsabilidade solidária em grupos econômicos.
Tais ações são facilitadas pela demonstração de dolo, que desqualifica o inadimplemento como mera dificuldade pontual de caixa, expondo o empregador a sanções maiores.
Consequências Criminais e Tendências Legislativas
O ordenamento jurídico brasileiro, embora tradicionalmente concentrado em punir ilícitos civis e trabalhistas nesse tipo de infração, caminha para reconhecer a dimensão penal do problema. Dolo na retenção de salário pode vir a ser enquadrado como crime de apropriação indébita trabalhista, a depender de tipificação expressa e da análise do caso concreto.
Enquanto o não pagamento de verbas rescisórias, por exemplo, já é interpretado pela jurisprudência como passível de reparação cível e trabalhista, o pagamento intencionalmente fraudado do salário em curso pode ensejar movimentações legislativas com foco no Direito Penal do Trabalho.
Advogados corporativos devem se atentar a essa tendência e recomendar que seus clientes invistam em prevenção e regularização de processos de folha de pagamento, de modo a evitar responsabilidades pessoais e criminais dos administradores.
Estratégias de Compliance Trabalhista e Contábil Para Empresas
Implementação de Governança de Pagamento de Salários
Empreendedores e gestores devem compreender que um processo de folha de pagamento seguro depende de:
– Sistematização e automação da folha com integração ao eSocial;
– Acompanhamento dates de vencimento de salários e encargos;
– Revisão periódica das práticas salariais e benefícios concedidos;
– Elaboração e atualização de políticas internas de compliance trabalhista.
A instituição de um Comitê de Ética ou órgão de compliance dentro da empresa pode contribuir para fiscalizar práticas desvirtuadas, como retenção injustificada de salários.
Relacionamento com Escrituração Contábil e Obrigações Fiscais
No campo contábil, é essencial manter total coerência entre:
– A data do fato gerador do salário (momento da prestação do serviço);
– A data do lançamento contábil na folha;
– O efetivo pagamento ou reconhecimento no passivo circulante;
– O pagamento tempestivo dos encargos sociais e retenções legais.
Descasamentos entre essas datas configuram inconsistência contábil e poderão ser apurados por auditorias independentes, órgãos de fiscalização ou devido a denúncia de trabalhadores.
Empresas que operam com compliance tributário elevado reduzem riscos de glosas fiscais, multas e embaraços operacionais em processos licitatórios ou operações de M&A (fusões e aquisições).
Vantagens para Empresas Que Mantêm Conformidade Salarial
Mantêm Regularidade Fiscal e Trabalhista
Empresas que pagam corretamente seus salários e encargos mantêm os seguintes documentos sempre disponíveis e positivos:
– Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT);
– Certidões de Regularidade junto ao FGTS e INSS;
– Redução de passivos ocultos em due diligences;
– Valorização da reputação da marca no mercado.
Ter uma base contábil coerente com os direitos sociais estabelece um diferencial competitivo especialmente para empresas que visam expansão ou captação de investidores.
Evita Litígios Dispendiosos e Penalizações
A judicialização do trabalho no Brasil ainda é alta. Reter salários de forma dolosa é uma das práticas que mais provoca ações indenizatórias e gera condenações exemplares.
Ao manter regularidade no pagamento, a empresa:
– Reduz custos com honorários jurídicos;
– Evita surpresa com bloqueios judiciais de contas e penhora online (Bacenjud/Sisbajud);
– Mantém previsibilidade financeira e segurança contábil;
– Atua com mais liberdade na distribuição de lucros e reorganizações societárias.
Conclusão e Insights Práticos
A retenção intencional de salários é uma prática que transcende o campo trabalhista, alcançando esferas contábil-tributária e, potencialmente, criminal.
Para os advogados que atendem empresas, é essencial compreender os riscos jurídicos plenos da conduta, inclusive com possibilidade de responsabilização pessoal de diretores e gestores. Já os empreendedores precisam entender que conformidade com pagamento de salários não é apenas uma obrigação legal, mas um investimento em sustentabilidade e credibilidade empresarial.
A integração entre o jurídico e o contábil é indispensável nesse processo. Boas práticas de governança, compliance e escrituração adequada podem evitar processos complexos e prejuízos financeiros graves.
Perguntas Frequentes
1. Qual a diferença entre simples atraso de salário e retenção dolosa?
O atraso de salário pode ocorrer por problemas financeiros pontuais. Já a retenção dolosa envolve a intenção do empregador de não pagar o salário devido mesmo tendo recursos para isso, o que pode configurar conduta ilícita com consequências legais agravadas.
2. Quais órgãos fiscalizam o pagamento de salários e encargos?
Os principais órgãos são a Receita Federal, a Secretaria de Inspeção do Trabalho, o Ministério Público do Trabalho e as Auditorias-Fiscais do Trabalho. Além disso, denúncias podem ser encaminhadas ao sindicato da categoria e ao poder judiciário.
3. A empresa pode sofrer sanções mesmo se o trabalhador não tiver reclamado?
Sim. A fiscalização trabalhista e tributária pode agir por iniciativa própria ou por denúncias anônimas. A empresa pode ser multada e autuada independentemente de reclamação formal do empregado.
4. A retenção de salários pode afetar a contabilidade da empresa?
Sim. Essa prática causa inconsistências nos registros contábeis, passivos omitidos ou subavaliados, e pode configurar fraude contábil, impactando a confiabilidade das demonstrações financeiras e implicando responsabilidade civil e penal de administradores.
5. O que devo implementar na minha empresa para evitar riscos com a folha de pagamento?
Estabeleça rotinas rigorosas de controle de folha, cumpra os prazos legais de pagamento, automatize os processos mediante integração contábil e mantenha políticas internas de compliance bem estruturadas, envolvendo os departamentos jurídico, financeiro e contábil.
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Este artigo teve a curadoria do time da IURE Digital e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir de seu conteúdo original em https://www.contabeis.com.br/noticias/71433/stf-da-180-dias-para-congresso-criminalizar-retencao-dolosa-de-salario/.